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Debêntures incentivadas e de infraestrutura nos setores rodoviário e ferroviário

Debêntures incentivadas e de infraestrutura nos setores rodoviário e ferroviário

Incremento de custo regulatório em contrapartida da previsibilidade de critérios.

(Artigo do sócio fundador Wesley Bento, coparticipação do advogado Lucas Rodrigues, para o portal Jota)

O Ministério dos Transportes editou, recentemente, a Portaria 689, de 17 de julho de 2024, que disciplina requisitos e procedimentos para enquadramento de projetos de investimento como prioritários no setor de infraestrutura de transportes rodoviário e ferroviário para emissão de debêntures incentivadas e de infraestrutura, bem como dispõe sobre o acompanhamento e fiscalização dos empreendimentos.

O regulamento promoveu inovações em relação à Portaria GM/MInfra 106/2021, no afã de garantir maior previsibilidade na aprovação de projetos aptos a emitir os títulos, mas optou por incrementar o custo regulatório em critérios adicionais aos do Decreto 11.964/2024.

As debêntures incentivadas, previstas no art. 2º da Lei 12.431/2011, e as debêntures de infraestrutura, disciplinadas na Lei 14.801/2024, são relevantes fontes de investimento de projetos de infraestrutura e de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação, que tendem a reduzir o custo de capital do investidor ao reduzir a carga tributária incidente sobre o título.

No caso das debêntures incentivadas, há alíquota zero para os rendimentos de pessoas físicas, ao passo que, nas debêntures de infraestrutura, há previsão de benefício fiscal à pessoa jurídica emissora, consistente na dedução, para efeito de apuração do lucro líquido, do valor correspondente à soma dos juros pagos ou incorridos, e exclusão, na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, do valor correspondente a 30% da soma dos juros relativos às debêntures.

A objetividade de critérios no plano regulamentar era esperada desde a Lei 14.801/2024, que dispensou aprovação ministerial para serviços sujeitos à titularidade ou regulação da União. Todavia, com a previsão do Decreto 11.964/2024 de que portarias estabeleceriam critérios e condições complementares para enquadramento nos setores prioritários, podendo, inclusive, “limitar o enquadramento a determinados subsetores ou tipos específicos de projetos” (art. 4º, § 1º), a pendência de regulamentação dos critérios para o enquadramento de projetos no âmbito do ministério havia levantado inseguranças de possíveis emissores de tais debêntures. Um ponto positivo da portaria foi a objetividade na definição de critérios em relação a investimentos federais.

Houve, porém, nítido incremento do custo regulatório com o implemento de critérios de sustentabilidade que excedem os previstos no art. 5º, § 1º, Decreto 11.964/2024. O Ministério dos Transportes optou por acrescentar medidas de sustentabilidade a título de requisito para o enquadramento do empreendimento como prioritário para se habilitar à emissão de debêntures incentivadas ou de infraestrutura, exigindo, como regra, que os projetos de investimento ou contratos que estejam associados prevejam:

  • investimento em mitigação de emissões de gases de efeito estufa, transição energética ou implantação e adequação de infraestrutura para resiliência climática, com vistas à adaptação às mudanças do clima; e
  • mecanismos de gestão do impacto da infraestrutura nos povos e comunidades afetados (art. 5º).

Nos investimentos referentes a bens ou serviços de titularidade da União ou por ela regulados e nos projetos assumidos perante outros entes da federação em regime de autorização, esses critérios de enquadramento somente serão exigíveis a partir de 25 de julho de 2025.

Quanto aos projetos de investimento de infraestrutura rodoviária ou ferroviária de titularidade dos estados, dos municípios ou do Distrito Federal ou por eles regulados, os referidos critérios para a emissão de debêntures incentivadas de infraestrutura somente serão exigidos para contratos cujos editais de licitação sejam publicados após 18 meses contados da data de entrada em vigor da Portaria 689 do Ministério dos Transportes (25/12/2025).

A aplicação do requisito de gestão do impacto da infraestrutura nos povos e comunidades afetados dependerá da publicação, pela ANTT, da regulamentação referente ao Plano de Sustentabilidade para concessões de rodovias e ferrovias. As emissões ainda não efetivadas no momento de entrada em vigor dos aludidos critérios deverão se sujeitar a eles, ainda que aprovadas ou protocoladas anteriormente.

As autorizações ferroviárias serão automaticamente enquadradas como projetos com previsão de mitigação de emissões de gases de efeito estufa, transição energética ou implantação e adequação de infraestrutura para resiliência climática. Trata-se de ponto acolhido após manifestações em consulta pública no sentido de que o transporte ferroviário já constitui meio eficiente de descarbonização.

No setor rodoviário federal, a alocação de, no mínimo, 1% da receita bruta da concessão para o desenvolvimento de infraestrutura resiliente às mudanças climáticas, na forma da Portaria n. 622/2024 do Ministério dos Transportes, também dispensará a comprovação do referido requisito (art. 5º, inciso I, da Portaria n. 689/2024).

Parte considerável das autorizações ferroviárias, todavia, deverá apresentar requisito complementar: somente serão enquadradas como prioritários os projetos que já tiverem licença prévia emitida por órgão ambiental competente. A disposição se destaca por uma assimetria que excede o escopo do art. 15, § 2º, do Decreto 11.964/2021, o qual, ao nortear a regulamentação da matéria em portaria, estabeleceu que critérios especiais de enquadramento para autorizações seriam instituídos para “garantir coerência em relação a eventuais concessões públicas vigentes ou em estruturação”.

Além disso, aparenta destoar do objetivo do legislador de não condicionar a emissão a crivo de aprovação do projeto. Embora a previsão pareça buscar proteger o investidor, aparenta se arvorar em competências da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que se incumbe de disciplinar a relação entre o emissor do título e o investidor.

Nesse ponto, também chama atenção a peculiaridade de que apenas se sujeitam a essa restrição as autorizações ferroviárias regidas “pela Lei 12.273, de 23 de dezembro de 2021”. A portaria não apresentou tal restrição às autorizações regidas pela Medida Provisória 1.065, de 30 de agosto de 2021, as quais, por força do art. 62, § 11, da Constituição Federal, tiveram suas relações jurídicas conservadas após a perda de vigência do ato normativo que as subsidiou.

No âmbito federal, o emissor deverá protocolar a documentação comprobatória dos requisitos para seu enquadramento como projeto como prioritário, disciplinada no art. 10 da Portaria 689/2024, na plataforma do governo federal. A Subsecretaria de Fomento e Planejamento do Ministério dos Transportes lhe fornecerá, em até 1 dia útil, o número do processo administrativo gerado, que será suficiente para a apresentação do requerimento de registro da oferta pública à CVM.

Em até 5 dias úteis do protocolo, atestará o cumprimento da obrigação de protocolo prévio ou a necessidade de complementação, oportunizando, nesse último caso, o envio de documentos adicionais em 15 dias úteis. Caso apresente toda a documentação exigida, o protocolo terá validade de 2 anos, contados do ateste da referida subsecretaria. Do contrário, o emissor pode ter o enquadramento de seu projeto como prioritário questionado, a ensejar a notificação da Secretaria Especial da Receita Federal e da CVM.

Em relação aos projetos sujeitos à contratação ou regulação de outros entes da federação, há procedimento de aprovação ministerial prévia. Após o protocolo da documentação pertinente ao enquadramento, a Subsecretaria de Fomento e Planejamento elaborará nota técnica em até 15 dias úteis, opinando sobre o cumprimento de formalidades, a compatibilidade do projeto com o planejamento setorial federal e os benefícios sociais ou ambientais advindos da implementação do projeto, ou instará o emissor a complementar a documentação, sob pena de arquivamento.

Após a nota técnica, o processo será encaminhado à Consultoria Jurídica, para manifestação sobre a legalidade do ato, em até 10 dias. Por fim, caso aprovado o projeto, será lavrada portaria em até 30 dias úteis, a qual deverá incluir “benefícios sociais ou ambientais advindos da implementação do projeto”; e o volume de recursos que se estima captar com a emissão de debêntures, comparado com a estimativa de despesas de capital necessárias para a realização do projeto.

As portarias de aprovação já editadas em relação a investimento federais passam a ter validade de apenas 12 meses a contar da data de entrada em vigor da Portaria 689/2024 do Ministério dos Transportes (art. 31). Trata-se de norma de validade questionável, à luz do art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, especialmente para situações que impliquem a redução do prazo de vigência de 2 anos de projetos aprovados à luz da Portaria 106/2021 do antigo Ministério da Infraestrutura e para projetos que já eram presumidamente prioritários à luz do art. 3º, incisos I e III, da referida portaria, hipótese que revestia a aprovação da natureza de ato administrativo vinculado.

No que concerne aos investimentos alusivos a outros entes da federação, as antigas portarias de aprovação permanecem válidas e poderão fundamentar emissão de novas debêntures nos termos e no prazo de vigência nelas estabelecidos.

Seja qual for a esfera da federação a que se reporta o projeto, a nova portaria do Ministério dos Transportes impõe a observância das exigências do Decreto 11.964/2024, das quais se destaca a limitação da emissão ao montante equivalente às despesas de capital dos projetos de investimento (art. 5º, § 2º, do Decreto n. 11.964/2024).

A versão final da portaria trouxe avanços em relação à minuta submetida à consulta pública. Ações de aquisição, reposição ou manutenção foram incluídas nos conceitos de despesa de capital; e projetos associados, bem como subconcessões, foram incluídas no escopo da emissão das debêntures incentivadas ou de infraestrutura. Por outro lado, critérios que elevam o custo regulatório, como a observância de normas de decreto posterior em relação a aprovações de projetos anteriores, foram incluídos sem consulta pública. A elaboração da análise de impacto regulatório em fase posterior à consulta pública também destoou da ordem estabelecida pelo art. 9º do Decreto 10.411/2020.

O normativo propõe um maior enfoque em sustentabilidade em projetos de infraestrutura rodoviária e ferroviária, mas suscita reflexões a respeito do incremento do custo regulatório de determinados projetos, da segurança jurídica de investimentos anteriormente aprovados como prioritários e de assimetrias no setor ferroviário.


Fonte: Jota

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