CONTEÚDO

Robôs deveriam pagar impostos? Tributação na Era Digital

Relatório do Parlamento Europeu aborda possibilidade de usar essa arrecadação como medida de assistência a desempregados.

(Artigo do sócio Eduardo Muniz Cavalcanti, coparticipação do advogado João Renato Barbosa David, para o portal UOL)

A inovação tecnológica, embora traga inúmeros avanços para a sociedade, especialmente na dinâmica industrial e de manufaturas, de modo a conferir maior grau de eficiência, automatização e maximização da produtividade, provoca, por outro lado, desafios no mercado de trabalho e da seguridade social, entre os quais a substituição dos empregos habituais por máquinas e o correspondente déficit fiscal do orçamento para atender as despesas com aposentadorias e pensões.

Por isso, para além do desenvolvimento econômico advindo dos sistemas computacionais e informáticos, não se pode descuidar de políticas e estratégias de enfrentamento dos efeitos adversos provocados na economia.

Do ponto de vista tributário, conquanto o Estado submerge na insuficiência de receitas, em contrapartida, aumenta significativamente a necessidade de assistência aos desempregados. Em países onde esse problema evidencia-se de maneira crítica, como Japão, Itália e Coreia do Sul, discute-se a tributação dos robots, desde que capazes de efetuarem atividades complexas o suficiente para substituir o trabalho manual, ao conferir a correspondente personalidade jurídica como elemento subjetivo tributável.

Admitida essa possibilidade, inúmeras perguntas são postas à reflexão, por óbvio, ainda sem respostas: o que seria robô para fins tributários? Como seriam tributados os diferentes robôs de acordo com as atribuições e tarefas desenvolvidas? Estaria ocorrendo disfarçadamente bitributação, haja vista a imposição fiscal dos robôs e, respectivamente, dos proprietários?

São inúmeras as variáveis que devem ser previamente examinadas e que estarão na pauta dos debates públicos. Não se trata de mera discussão filosófica, porque, cedo ou tarde, os dados indicam que, enquanto aumenta o domínio da inteligência artificial, em 2060 no Brasil, segundo a OCDE, 46 pessoas entre 100 economicamente ativas terão mais de 65 anos, com expectativa média de vida próxima aos 90.

Os rendimentos dos trabalhadores precisam triplicar para que se mantenha sustentável o nível de arrecadação do sistema de seguridade social. A considerar esses números a previdência no Brasil é um “esquema de pirâmide”.

O Parlamento Europeu, em 2017, produziu o relatório intitulado Report with Recommendations to the Commission on Civil Law Rules on Robotics. Neste documento foi abordada pela primeira vez a possibilidade de, frente à substituição de trabalhadores humanos por máquinas, taxar robôs como medida de assistência aos desempregados. Ainda que não concretizada em legislação, este relatório evidencia a necessidade de tratar desta temática e serve de vanguarda para uma futura consolidação da proposta.

No âmbito da substituição de trabalhadores por robôs, os números são alarmantes e preveem um “boom” de robôs no mercado brasileiro. De acordo com a Federação Internacional de Robótica, a média global de densidade de robôs no mercado de trabalho é de 141 robôs para cada 10.000 trabalhadores. Já no Brasil existem meros 16 robôs para cada 10.000 trabalhadores.

O desenvolvimento gradual que nos encontramos é fonte de preocupação mesmo para grandes players no mercado, como Elon Musk e Bill Gates. Para Elon Musk, CEO da Tesla, SpaceX e X (antigo Twitter), devemos antecipar um mundo no qual empregos já não mais serão necessários, prevendo uma renda básica universal, enquanto para Gates, essa renda poderia ser oriunda de uma taxação dos robôs que ocupem posições de humanos.

À medida que avançamos na era da automação e da inteligência artificial, são prementes inquietações a respeito de como equilibrar os benefícios inegáveis que a tecnologia traz para a sociedade com os desafios por ela estabelecidos, pois, conquanto expansivamente tem-se o crescimento econômico, ambiguamente ocorre a desestabilização do mercado de trabalho, inclusive com o aumento das desigualdades socioeconômicas.

A provocação que se põe é não apenas tecnológica, mas profundamente social e ética, de modo a assegurar que esses avanços beneficiem a coletividade, sem sacrifícios dos indivíduos, sobretudo dos mais vulneráveis. Trata-se de reflexão a ser feita de imediato, ao tempo em que são implementadas políticas inclusivas que promovam tanto a educação como a requalificação profissional dos trabalhadores, bem assim a construção de uma estrutura tributária adaptada para lidar com as realidades econômicas da Era Digital. “Não podemos resolver nossos problemas com o mesmo pensamento que usamos quando os criamos”, nas palavras de Albert Einstein.


Fonte: UOL

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