A fiança bancária como garantia nos contratos administrativos

A fiança bancária como garantia nos contratos administrativos

Interpretação da nova Lei de Licitações deve ser feita em conjunto com as regras do BC.

(Artigo do sócio Wesley Bento para o portal Jota)

Como ocorreu com outros tópicos, o perfil de garantias previsto na nova Lei de Licitações e Contratos não apresentou revolução comparado com o que já dispunha a Lei 8.666/93. Não houve mudanças nas modalidades, permanecendo a caução em dinheiro ou título da dívida pública, seguro-garantia e fiança bancária (art. 96, § 1º) como opções idôneas para o contratado.

Houve algum impulso ao seguro-garantia, especialmente na autorização para que em obras e serviços de engenharia se exija o seguro de até 30% do valor do contrato e, ainda, do tipo performance bond, com a previsão de que a seguradora, em caso de inadimplemento pelo contratado possa assumir a execução e concluir o objeto do contrato (step in), colaborando para a redução do elevado número de obras paralisadas.

Para a fiança bancária, a nova legislação se limitou a registrar a tautologia de que pode ser fornecida por “bancos”, equiparando para essa finalidade a “instituição financeira devidamente autorizada a operar no País pelo Banco Central do Brasil”.

A fiança, como contrato acessório, solene, personalíssimo e unilateral pode ser prestada, como regra, por qualquer agente capaz, desde que aceito pelo credor. Mesmo na esfera privada, o credor não está obrigado a admitir qualquer fiador, caso ele não seja pessoa idônea, não tenha residência no domicílio onde preste a fiança e, principalmente, não tenha bens suficientes para cumprir a obrigação.

Na relação jurídica estabelecida sob as balizas da Lei 14.133/2021, a qualidade do fiador não está submetida a critério discricionário do gestor público, mas vinculada a se tratar de banco ou instituição financeira autorizada, a quem a lei atribui presunção de idoneidade e capacidade financeira.

Banco é uma instituição financeira, com a característica de intermediar o dinheiro entre poupadores e os que demandam empréstimos, além de custodiar esse dinheiro, oferecendo serviços como saques, empréstimos, investimentos, entre outros. Existem outras instituições financeiras autorizadas a operar pelo Banco Central, como sociedades de crédito imobiliário, agências de fomento, fintechs de crédito e corretores de câmbio, com abrangência dos serviços reduzida em relação aos bancos, sobretudo quanto à capacidade de captar recursos no mercado.

Apesar de a Lei de Licitações admitir, genericamente, a fiança prestada por instituições financeiras diversas dos bancos, sua interpretação deve ser feita em conjunto com as regras do BC quanto às limitações próprias de cada modelo de instituição. A Resolução BCB 2.325/1995 faculta a prestação de garantias apenas aos bancos múltiplos, bancos comerciais, bancos de investimento, bancos de desenvolvimento, caixas econômicas, sociedades de crédito, financiamento e investimento, sociedades de crédito imobiliário, companhias hipotecárias e cooperativas de crédito.

As sociedades de crédito direto (SCD) e as sociedades de empréstimo entre pessoas (SEP), por exemplo, embora instituições financeiras, têm sua atividade limitada pelos serviços descritos na Resolução CMN 5050, de 25 de novembro de 2022, não se incluindo a prestação de garantia, o que foi inclusive objeto do Comunicado 41.321, de 5 de março de 2024, emitido pelo Banco Central.

A lei tampouco admite a fiança prestada por pessoa natural ou por qualquer pessoa jurídica diversa das autorizadas pelo BC, como as chamadas sociedades afiançadoras, que não estão sujeitas à autorização e fiscalização pelo Banco Central e não preenchem os requisitos legais para oferecer garantia suficiente em contratos administrativos regidos pela Lei 14.133/2021, segundo a compreensão também do Tribunal de Contas da União (TCU*.

A apresentação de cartas de fiança fora dos parâmetros normativos adequados opera contra a boa administração do processo licitatório de duas formas: prejudica a competitividade por permitir a oferta de preços artificialmente inferiores por quem pretende se valer dessas garantias, cujo preço de aquisição é substancialmente menor que a fiança bancária; e fragiliza a expectativa da Administração de ser efetivamente ressarcida em caso de descumprimento contratual, diante da presumível debilidade financeira de quem presta a fiança nessas condições, o que justifica a atuação dos órgãos de controle, inclusive para a aplicação das sanções cabíveis.

* TCU – Acórdão 597/2023-Plenário.


Fonte: Jota

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